terça-feira, 2 de novembro de 2010

Escultura Neoclássica

O Neoclassicismo foi uma corrente filosófica e estética de larga e influente difusão que se desenvolveu entre meados do século XVIII e meados do século XIX na Europa e nas Américas. Reagindo contra a frivolidade e decorativismo do Rococó, a escultura neoclássica inspirou-se na antiga tradição greco-romana, adotando princípios de ordem, clareza, austeridade, equilíbrio e propósito, com um fundo moralizante.
No terreno da escultura o impacto de novidade dos novos conhecimentos adquiridos foi menor do que nas outras artes, como a pintura e a arquitectura, pois os escultores já bebiam na fonte clássica deste o século XV, mas seus melhores resultados na reinterpretação da tradição greco-romana não deixaram de mostrar a mesma elevadíssima qualidade. A má interpretação da estética defendida por Wickelmann levou, porém, a artistas de menor génio produzirem inúmeras obras com carácter de cópia servil dos modelos antigos, perdendo em vigor e contribuindo para atrair críticas para o movimento.


Em linhas gerais buscou-se evitar o extremo contorcionismo da estatuária barroca e predominaram as formas mais naturalistas, e o colorido de superfície foi praticamente abandonado de todo em favor da exposição completa do material constituinte da obra. A temática privilegiou a história e mitologia greco-romanas, com muitos elementos alegóricos e grande ênfase no nu, e a retratística enalteceu os homens públicos meritórios.


As obras mostravam em geral alto nível de equilíbrio formal, com uma expressividade circunspecta e raros momentos de drama. Canova foi o mais bem sucedido na exploração de uma ampla gama de sentimentos e de formas mais dinâmicas, passando da tranquila ingenuidade juvenil em peças como As três graças, até à violência desmedida no Hércules e Licas e no Teseu derrotando o centauro, e pesquisando outras regiões da emoção como o arrependimento, visível na patética Madalena penitente.

Dos materiais foram favorecidos o bronze e em especial o mármore branco, exactamente como na tradição antiga, mas, ao contrário de épocas anteriores, no Neoclassicismo o artista criador passou a empregar cada vez mais artífices auxiliares para realizarem a maior parte do trabalho técnico de transportar a forma para a pedra ou realizar a fundição a partir de um modelo de argila ou gesso que havia sido criado por ele, deixando que o mestre assumisse a escultura definitiva apenas em seus estágios finais de polimento e definição de detalhes, apesar de que esta fase seja de fato decisiva para obtenção do efeito final da obra e exija a perícia superior da mão do mestre, e com isso tenham-se desenvolvido diversas técnicas mais eficazes de reprodução das obras.
Esta mudança floresceu amparada em duas vertentes principais: por um lado os ideais do Iluminismo, que tinham base no racionalismo, combatiam as superstições e dogmas religiosos, e enfatizavam o aperfeiçoamento pessoal e o progresso social com forte carga ética, e por outro, um crescente interesse científico pela antigüidade clássica que surgiu entre a comunidade acadêmica ao longo do século XVIII, estimulando escavações arqueológicas, a formação de importantes colisões públicas e privadas e a publicação de estudos eruditos sobre a arte e cultura antigas. A publicação de vários relatos detalhados e ilustrados de expedições por Robert Wood, John Bouverie, James Stuart, Robert Adam, Giovanni Battista Borra e James Dawkins, e especialmente o tratado de Bernard de Montfaucon, L'Antiquite expliquee et representee en figures (10 volumes, Paris, 1719-24), fartamente ilustrado e com textos paralelos em línguas modernas e não apenas no latim como era o costume académico, e o do Conde de Caylus, Recueil d'antiquites (7 volumes, Paris, 1752-67), o primeiro a tentar agrupar as obras segundo critérios de estilo e não de género, e abordando também as antiguidades celtas, egípcias e etruscas, contribuíram significativamente para a educação do público e um alargamento de sua visão do passado, estimulando uma nova paixão por tudo o que fosse antigo.


Acrescente-se a isso a descoberta de Herculano e Pompeia, uma grande surpresa entre os conhecedores e o público, e embora as escavações que começaram a ser realizadas nas ruínas em 1738 e 1748 não tenham encontrado obras-primas em arte, trouxeram para a luz uma quantidade de relíquias e artefactos que revelavam aspectos da vida quotidiana até então desconhecidos. E a chegada dos Mármores de Elgin a Londres em 1806 foi outro momento importante para a intelectualidade europeia, apesar das pesadas críticas a respeito de sua remoção arbitrária e predatória do Partenon e do reduzido interesse que os artistas demonstraram por eles num primeiro momento.


Apesar de a arte clássica ser apreciada desde o Renascimento, o era de forma circunstancial e empírica, mas agora o apreço se construía sobre bases mais científicas, sistemáticas e racionais. Com essas descobertas e estudos começou a ser possível formar pela primeira vez uma cronologia da cultura e da arte dos gregos e romanos, distinguindo o que era próprio de uns e de outros, e fazendo nascer um interesse pela tradição puramente grega que havia, na época, sido ofuscada pela herança romana, ainda mais porque na época a Grécia estava sob domínio turco e por isso, na prática, era inacessível para os estudiosos e os turistas do Ocidente cristão. Os escritos de Johann Joachim Winckelmann, um erudito de grande influência especialmente entre os intelectuais italianos e alemães, incluindo Goethe, enalteceram ainda mais a escultura grega, e vendo nela uma "nobre simplicidade e tranquila grandeza", apelou a todos os artistas para que a imitassem, restaurando uma arte idealista que era despida de toda transitoriedade, aproximando-se do carácter do arquétipo.
Seu apelo não passou despercebido, e a história, literatura e mitologia antigas passaram a ser a fonte principal de inspiração para os artistas, ao mesmo tempo em que eram reavaliadas outras culturas e estilos antigos como o gótico e as tradições folclóricas européias do norte, fazendo com que os princípios neoclássicos coexistissem mais tarde com os do Romantismo.


O movimento teve também conotações políticas, já que a origem da inspiração neoclássica era a cultura grega e sua democracia, e a romana com sua república, com os valores associados de honra, dever, heroísmo e patriotismo. Como consequência, o estilo neoclássico foi adoptado pelo governo revolucionário francês, assumindo os nomes sucessivos de estilo Directório, estilo Convenção e mais tarde, sob Napoleão, estilo Império, influenciando a Rússia. Nos Estados Unidos, no tumultuado processo de conquista de sua própria independência e inspirados no modelo da Roma republicana, o Neoclassicismo se tornou um padrão e foi conhecido como estilo Federal. Entretanto, desde logo o Neoclassicismo se tornou também um estilo cortesão, e em virtude de suas associações com o glorioso passado clássico, foi usado pelos monarcas e príncipes como veículo de propaganda para suas personalidades e feitos, ou para prover de belezas seus palácios num simples decorativismo, desvirtuando em parte seus propósitos moralizantes, ainda que a estética tenha se preservado, produzindo mesmo assim grandes obras.


O Neoclassicismo foi adoptado também, logicamente, pelas academias oficiais de formação de artistas, consolidando o sistema académico de ensino, ou Academismo, um conjunto de preceitos técnicos e educativos que se apoiavam nos princípios éticos e estéticos da antiguidade clássica e que logo se tornou a denominação para o estilo da sua produção, confundindo-se em larga medida com o puro Neoclassicismo.